quinta-feira, 23 de agosto de 2012

O USO DO CRACK


O crack é uma substância psicoativa euforizante, estimulante, preparada à base da mistura da pasta de cocaína com bicarbonato de sódio. Para a obtenção das pedras de crack também são misturadas à cocaína diversas substâncias tóxicas como gasolina, querosene e até fluido de bateria. A pedra de crack não é solúvel em água e, por isto, não pode ser injetada na veia. Ela é fumada em cachimbos, tubos de PVC ou aquecida em latinhas de refrigerante, cerveja ou similares. Após ser aquecida em temperatura média de 95°C, passa do estado sólido ao estado de vapor. Quando queimada, produz o ruído que lhe deu o nome. Pode ser misturada com maconha e fumada junta.
Ao ser fumado, o crack é absorvido pelo pulmão e chega ao cérebro em menos de 10 segundos. Após a “pipada” (ato de inalar a fumaça), o usuário sente grande prazer, intensa euforia, sensação de poder, excitação, hiperatividade, insônia, perda de sensação de cansaço e falta de apetite. O uso passa a ser compulsivo, pois o efeito dura apenas de 5 a 10 minutos e a “fissura” (vontade) em usar novamente a droga torna-se incontrolável. Segue-se repentina e profunda depressão e surge desejo intenso de uso repentino e imediato. Assim, serão usadas muitas pedras em seguida para manter o efeito estimulante.
Por ser fumado, o crack se expande pela grande área da superfície do pulmão e é absorvido em grande parte pela circulação sanguínea. O efeito é rápido e potente; porém, passa depressa, o que leva ao consumo desenfreado.
As consequências físicas do uso do crack em médio e longo prazo são danos ao pulmão associados a fortes dores no peito, asma e bronquite; aumento da temperatura corporal com risco de causar acidente vascular cerebral; destruição de células cerebrais, neurônios, e degeneração muscular, o que confere aquela aparência esquelética ao usuário frequente, inibição da fome e insônia severa.
Além disso, os materiais utilizados para a confecção dos cachimbos são, muitas vezes, coletados na rua ou no lixo e apresentam iminente risco de contaminação infecciosa, gerando potencial elevação dos níveis de alumínio no sangue, de modo a aumentar os danos no sistema nervoso central. Também são comuns queimaduras labiais, no nariz e nos dedos dos usuários.
Já as consequências psicológicas do uso do crack em médio e longo prazo são, dentre outras, fácil dependência após uso inicial, grande desconforto durante abstinência gerando depressão, ansiedade e agressividade contra terceiros. Há a diminuição do interesse sexual. Como a necessidade não tem lei, a necessidade do uso frequente acarreta delitos, para a obtenção de dinheiro, venda de bens pessoais e familiares, e até prostituição da forma mais degradante como, por exemplo, em muitas vezes, usuários se disponibilizam à prática do sexo oral, em terceiros, em troca de pedras de crack, tudo para sustentar o vício. A promiscuidade leva a grave risco de se contrair AIDS e outras DSTs (Doenças Sexualmente Transmissíveis). O usuário apresenta, com frequência, atitudes bizarras devido ao aparecimento de paranoia (“noia”), colocando em risco a própria vida e a dos outros.
As consequências sociais do uso do crack em médio e longo prazo são, dentre outras, o abandono do trabalho, dos estudos ou de qualquer outro interesse que não seja a droga, o crack; deterioração das relações familiares, com violência doméstica e frequente abandono do lar; grande possibilidade de envolvimento com criminalidade. A ruptura ou a fragilização das redes de relação social, familiar e de trabalho normalmente leva ao aumento da estigmatização do usuário, agravando sua exclusão social. Também é comum que usuários de crack matem e sejam mortos em função do vício. Uma vida humana ao preço de uma pedra de crack.
Por muito tempo, a dependência química do uso do crack foi considerada uma doença social masculina; aspectos sociais e culturais propiciavam mais acesso masculino às drogas e levavam a crer que eles seriam mais suscetíveis. No entanto, atualmente, o consumo de substâncias ilícitas e álcool por mulheres, homens adultos e adolescentes é indiscriminado. No caso do cigarro e do crack, implicam-se no uso até mesmo de crianças de várias idades.
Também, acreditava-se anteriormente que seu uso era mais intenso nas classes de baixa renda, porém, hoje, a utilização do crack já ocorre em todas as classes sociais. As populações mais vulneráveis, entre elas, moradores de rua, crianças e adolescentes constituem importante grupo de risco. Destarte, os sinais para reconhecimento do uso de crack são:
Ø Abandono de interesses sociais não ligados ao consumo e compra de drogas;
Ø Mudança de companhias e de amigos não ligados ao consumo de entorpecentes e drogas afins;
Ø Visível mudança física, perda de pelos, pele ressecada, envelhecimento precoce;
Ø Comportamento deprimido, cansaço, descuido na aparência, irritação e agressividade com terceiros por palavras e atitudes;
Ø Dificuldades ou abandono escolar, perda de interesse pelo trabalho ou hábitos anteriores ao uso do crack;
Ø Mudança de hábitos alimentares, falta de apetite, emagrecimento e insônia severa;
Ø Atitudes suspeitas, como telefonar para pessoas desconhecidas dos familiares com frequência e “sumir de casa” constantemente sem avisar;
Ø Extorsão de dinheiro da família com ferocidade;
Ø Mentiras frequentes, recusa em explicar mudança de hábitos ou comportamentos inadequados.
O uso do crack pode ser associado ao uso de outras drogas. É comum que usuários de crack precisem de outras substâncias psicoativas no período das chamadas “brisas”, ou seja, no período imediatamente após o uso do crack. Nesse momento, acabando o efeito estimulante, há grande mal-estar, podendo ser usados álcool, maconha ou outras substâncias para redução dessa péssima sensação.
O sofrimento psíquico decorrente do uso do crack induz o usuário a múltiplas dependências.
Em consonância com a tragedia pessoal de cada um, há atitudes que podem agravar ainda mais a situação do usuário de crack como, por exemplo, no início do uso da droga, o indivíduo ilude-se, imaginando que “com ele vai ser diferente”. Que “não vai se tornar um viciado”. Mesmo quando progride para a dependência, continua acreditando que “para quando quiser” e não percebe que, na realidade, não quer parar nunca. Pelo contrário, quer sempre mais e mais mergulhar no abismo sem fundo do crack.
A atitude de negação da doença por parte da família também é muito nociva. A família não deve sustentar mentiras para si mesma, “amenizando” a gravidade da situação e acreditando que o usuário deixará de usar o crack com o tempo ou sem ajuda de terceiros.
Pessoas que são dependentes de álcool ou tabaco, apesar de serem drogas lícitas, devem entender que, para criticar o outro por se tornar dependente do crack, precisa antes corrigir em si mesmas estes hábitos, pois, do contrário, não têm alcance, como exemplo a ser seguido ou ouvido.
As atitudes que podem ajudar, por exemplo, aos pais e às demais pessoas que tenham alguém querido sob suspeita de uso de crack, principalmente, em faixa de idade vulnerável, como crianças e adolescentes, é procurar manter bom relacionamento com o suposto viciado que garanta abertura para o diálogo. O melhor é saber de sua vida, com quem anda acompanhado, os lugares que frequenta, seu desempenho no trabalho ou na escola. É profícuo observar se ocorrem mudanças bruscas no comportamento. A manutenção do vínculo afetivo é muito importante tanto para a detecção do problema  quanto para a solução no tratamento. É necessário que haja atenção quanto ao ambiente escolar e à vizinhança.
Também é oportuno orientar seu filho ou ente querido a afastar-se de pontos de venda de drogas e dos frequentadores desses locais. Adolescentes comumente apresentam comportamento destemido e se sentem desafiados a aproximarem-se do perigo para terem a ilusão de que estão acima do bem e do mal. Em Paulista, há dois pontos de venda e de consumo do crack: Conjunto Antônio Mariz e Rio Piranhas.
Como adulto, é salutar deixar claro que sua autoridade é fruto não apenas de amor, mas de capacidade de entender o mundo atual e saber diferenciar o que destrói, em oposição à sedução do traficante. Os agentes do tráfico procuram ser simpáticos e amistosos para com sua população-alvo. Ensinam gírias próprias e não destoam da imagem da moda seguida pelo público visado por eles.
Quanto às possibilidades de tratamento, inicialmente, é necessário fazer uma avaliação do paciente para saber sobre o efetivo consumo de crack. A partir deste perfil 1, ele deverá ser encaminhado ao ambiente e ao modelo de atenção adequado. Deve ser verificado o grau de dependência e o uso nocivo, assim como a intenção voluntária de busca de ajuda para o tratamento.
É preciso entender qual o padrão do consumo, que pode oscilar muito, e indicar a gravidade do quadro em relação a cada usuário de crack. Destarte, são caracterizados três modos de consumo de crack:
Ø Baixo risco: com raros e leves problemas. Isto é excepcional entre usuários de crack, praticamente inexistente;
Ø Uso nocivo ou abuso: que combina baixo consumo com problemas frequentes (observável em usuários recentes);
Ø Dependência: alto consumo com graves problemas (é o perfil 1 do usuário que busca serviço especializado).
O usuário também deve ter a sua disposição para o tratamento avaliada. É o que se chama classificar o “estágio motivacional”, que irá definir as estratégias e atividades para promoção do tratamento individual.
Dentro dos princípios para investigação motivacional, o usuário não tem consciência de que precisa mudar. É resistente à abordagem e à orientação.
Ele reconhece o problema, aceita a abordagem sobre mudança, mas continua “valorizando” e usando droga. Também reconhece o problema, percebe que não consegue resolver sozinho e pede ajuda. Essa fase pode ser passageira, daí ser necessário pronto atendimento quando solicitado pelo indivíduo.
O usuário interrompe o consumo, inicia tratamento voluntário e precisa ser acompanhado por longo tempo, mesmo melhorando, pois ainda corre grande risco de recaída, mantendo-se ambivalente diante da droga.
Na fase da manutenção, o usuário está em abstinência, com risco de recaída, ainda possível pela ambivalência de sua relação com a droga e fatores de risco próprios de cada caso. Pensa nela com frequência. Cuida-se preventivamente do risco de recaída.
Havendo o retorno ao consumo, após período longo de abstinência, é importante notar que recair não é voltar ao zero. É necessária essa percepção, para retornar a recuperação, afim de que a culpa e a desesperança não destruam o novo empenho de melhora.
Quanto mais pronto e motivado o individuo, mais objetiva será a proposta terapêutica, enquanto a situação contrária implicará mais negociação e tempo. Devem ser tratados também problemas psiquiátricos paralelos ao uso do crack. O uso medicamentoso é indicado para auxiliar na redução da vontade do uso da substância (supressão da “fissura”), avaliar os sintomas da abstinência e diminuir ou mesmo inibir o comportamento de busca. O tratamento multidisciplinar é a melhor forma de intervenção nestes casos e permite saciar as amplas necessidades, principalmente, do usuário que precisará de abordagens terapêuticas por longo tempo.
A recuperação depende fundamentalmente do apoio familiar, da comunidade e da persistência da pessoa. Quanto mais precoce a busca de ajuda, mais provável o sucesso do tratamento. Este é penoso, com grande sofrimento físico e psicológico, além de, dependendo do caso, significativa possibilidade de recaídas.
Mesmo o indivíduo abstinente pensa com frequência na droga. É preciso tomar isso em consideração, para não desanimar e ter coragem de continuar.
A ajuda profissional é indispensável, porém, amor, compreensão e paciência não são apelos demagógicos; mas, sim, estratégias concretas de ajuda, que qualquer decisão pode proporcionar ao seu semelhante em risco. Manter-se bem informado e ter boa vontade são atitudes que podem contribuir muito para o tratamento dos dependentes químicos.
Não há tratamento único para o crack. O poder público, o município, deve ter políticas na área da saúde para prestar atenção integral ao usuário de drogas e às famílias. A detecção precoce e imediata intervenção são importantes aliados no enfrentamento da questão. Para qualquer atendimento, deve-se procurar o CAPSad – Centro de Atenção Psicossocial – Álcool e Drogas ou o Programa Saúde da Família no município do cidadão usuário de drogas.
Neste ínterim, faz-se necessário alertar acerca da droga de uma droga ainda mais devastadora que a droga do crack: a merla, também conhecida como mela, mel ou melado. Preparada de forma diversa do crack, apresenta-se sob a forma de uma base e também é fumada. Utilizada predominantemente no Distrito Federal, mas com registros em outros estados e municípios do país, a merla é extremamente tóxica e acarreta sérias complicações médicas.
Em suma, é extremamente importante alertar a população de que o problema supracitado já se instalou em Paulista. O Poder Executivo, o Poder Legislativo, o Poder Judiciário, o Ministério Público e o Conselho Tutelar deste município devem adotar medidas urgentes acerca do problema sob pena de serem responsabilizados de acordo com o que reza o Artigo 5°, Inciso XLIII da Constituição Federal: “A lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem”.
A vontade de viver é uma força poderosa. Destarte, as nossas autoridades, que têm conhecimento de tudo o que está acontecendo em Paulista concernente às drogas, não devem fechar os olhos, tapar os ouvidos e cruzar os braços enquanto que os traficantes “enriquecem” à custa das lágrimas de uma mãe que perde os seu filho para as drogas. Em muitas vezes, o valor de uma dessas vidas humanas não passa de R$ 10,00 (Dez reais), o valor de uma pedra de crack.

Autor: Abel Alves

Nenhum comentário: